Apontado como um divisor de águas na vida estudantil, o vestibular é o único caminho que existe para que qualquer brasileiro ingresse em uma instituição pública de ensino superior. Todos os anos, milhares de estudantes de cursinhos e escolas públicas tentam o concurso e travam uma disputa desigual por uma vaga na Universidade
O vestibular é o concurso mais temido e odiado pelos estudantes do Brasil. É implantado na rotina escolar cada vez mais cedo e vem a cada semestre ganhando mais importância na sociedade brasileira. O que se previa quando houve o boom das Faculdades privadas não se cumpriu. Ano após ano, a concorrência por vagas em Instituições Públicas de Ensino Superior vem ficando mais agressiva, e a repugnante prova tem sido vista por muitos como uma batalha selvagem entre os jovens das mais diversas camadas sociais.
Quem são os vencedores e os derrotados de tão temível disputa? As centenas de Outdoors e Busdoors espalhados pela cidade transmitem a idéia de que os únicos iluminados são os estudantes das suas próprias instituições anunciantes. E, em parte, têm razão. Nos últimos anos, os alunos oriundos das escolas públicas não tem tido a menor chance frente aos estudantes advindos de cursinhos ou escolas particulares. Só no meu curso (Jornalismo – UFC), das 25 pessoas que entraram, apenas 1 veio da rede pública.
As causas da tamanha discrepância no vestibular podem ser postas à mesa com alguma facilidade. Podemos começar com um problema embrionário da educação brasileira: a falta de estrutura das escolas públicas. Enquanto os Aris de Sás da vida possuem centros de apoio ao vestibulando, bibliotecas bem equipadas e professores capacitados, muitas escolas da rede pública de ensino apresentam justamente o cenário oposto, impedindo qualquer progresso dos alunos vinculados a este tipo de instituição. Outro fator relevante se aplica à própria forma como o vestibular é aplicado. A prova testa todo o conhecimento passado ao longo de 10 anos de escola. Dessa maneira, muitos estudantes sentem-se perdidos com conteúdos totalmente sem conexão com o curso pleiteado.
Iana Lara Braz, aluna do Liceu do Ceará, revela a gravidade da situação: “Os professores não se interessam. Não tem nem biblioteca para a gente estudar. No último vestibular, dos quase 600 alunos pré-vestibulandos do Liceu do Ceará, somente 6 foram aprovados". Segundo a estudante, além de tudo isso, um importante aspecto psicológico ainda é levado em conta: "muitos dos estudantes não tem confiança em si mesmos e nem tentam a prova".
Não estou defendendo aqui que o estudante de escola particular, por ser de instituição privada, não tenha direito à Universidade Pública, ou mesmo, que seja feita uma política de cotas para estudantes da rede pública. Isso, com certeza, só taparia o sol com a peneira. No entanto, a desigualdade que este concurso vem apresentando já transborda o nível do inaceitável.
O pior de tudo é que o Governo Lula vem tentando solucionar esse drama nacional da pior maneira possível. Imaginemos a Educação brasileira como uma casa quase para desabar. Qualquer pedreiro (nada relacionado à escolaridade do chefe de estado) de respeito iniciaria uma reforma pelas bases da casa. No entanto, o nosso mestre-de-obras resolveu iniciar a recuperação da casa com um telhado novo sobre um amontoado colunas condenadas. Resultado: o telhado caiu e a casa não foi reformada. É assim que o Prouni vem funcionando. Levar alunos de escolas públicas com sérias deficiências no Ensino Básico (o nome já diz tudo) para a Faculdades Privadas não proporciona qualquer avanço, a não ser nos números eleitoreiros do governo. Como que um aluno desses vai estar durante o curso? Com que preparação ele vai ser inserido no mercado de trabalho? Da mesma forma que um aluno pobre perde a concorrência para o rico no vestibular, vai perder na luta por um emprego, por não ter feito um curso com a mesma qualidade de um aluno que a vida inteira teve um bom Ensino Básico.
Sinceramente, não me conformo com a política do “pelo menos já é alguma coisa”. Os estudantes menos favorecidos clamam por uma saída de verdade. O vestibular, além de ser uma grande mentira, pois é feito por e para uma parcela da sociedade, ainda faz emergir o câncer da desigualdade social.
6 comentários:
Muito pertinentes todos esses pontos que você levantou, caro Gustavo.
Um aspecto, em especial, me chama a atenção: o que pensam esses estudantes de Universidade Pública dessa dinâmica mais do que conhecida no nosso cotidiano? Por que, afinal, mesmo havendo um mínimo de indignação e constrangimento por tal situação, não há nenhuma reação ou resposta dessa parte mais "esclarecida" da sociedade?
Esse sujeitos (especialmente os mais combativos e engajados na defesa de valores altivos como 'liberdade' e 'direito') realmente buscam, no movimento estudantil, uma melhora da educação!? Você já viu uma manifestação de estudantes universitários defender melhorias para creches e escolas de ensino básico!? Não, né!? (Seria até engraçado, de tão absurdo...)
Enfim, perguntas sem respostas (porque sabem mas ninguém quer dar)...
Caro Gustavo...
Muito pertinente suas colocações... Que o diga eu, que acabei de fazer uma prova de segunda fase da UECE...
Como gostaria que as escolas voltassem a ser uma extênção do braço familiar responsável não só por dar instruções acadêmicas, mas também para a vida...
O que vejo são "fábricas" de candidatos em potencial para vestibulares... O senso critico não é estimulado, mas tão somente a objetividade fria de responder questões com quatro ou cinco opções.
E a escola pública com alunos entregues a própria sorte...
Desigualdade social? Violência? Jovens infratores? Diminuir a maioridade para 16 anos?
É muito facil para o Estado reclamar da falta de controle, ordem e comportamento de nossa juventude... Porque os "jovens infratores" tem que tomar uma postura cidadã, se o proprio estado, à tempos, os tratam como a escória do mundo...
Não seria uma incierência tão grande quanto a de se colocar "chifre" na namorada o tempo todo e ter a cara-de-pau de exigir fidelidade da mesma?
Como bem pode constatar meu caro Gustavo e ilustre leitor, ao que me parece, o buraco é mais embaixo.
"Passou o tempo de dar lápis e papel pra eles... Agora temos que dar é bala!!!"
*** Secretario de segurança de São Paulo em audiência pública diante de uma série de atentados do PCC nas ruas da capital paulista no ano passado.
"A nossa indignação é uma mosca sem asas, que não ultrapassam as janelas de nossas casas... Indignação indigna, indigna in(ação)..."
Skank
O Estado que não cuida (Facundo) é o mesmo que defende liberdades e direitos (Sávio) de uma parcela da sociedade (Gustavo).
Desculpem se rearranjei as falas de uma forma diferente do que elas seriam separadamente, mas elas são o recurso pra eu expressar o que sinto. Basta reuni-las assim e economizo alguns neurônios. Vocês juntos pensaram coisas perfeitamente conectáveis. Obrigada =P
Um bom Ensino Básico pode decidir quem ocupará uma vaga de emprego sim.
Vocês não imaginam quantos textos com erros grosseiros eu já li. Textos de alunos que estavam terminando um curso de Pedagogia ou de Jornalismo em uma universidade particular, vindos de um Ensino Básico precário, seja ele público ou não.
Estes alunos conseguem ser aprovados nas disciplinas através de serviços pagos de revisão e até mesmo produção de textos.Uma moça que se utilizou do serviço estava falando sobre ele no balcão da papelaria enquanto tirava cópia de seu trabalho final de curso.O comércio é intenso, especializado e acessível. Bom, relativamente acessível. Uma monografia custa cerca de quatro mil reais.
Vestibular a serviço do Mercado. Estado a serviço do Mercado. Universidade a serviço do Mercado (quem duvida do direcionamento de suas pesquisas através de incentivos como prêmios e bolsas)?
O Mercado tem pressa e apressa o Estado, que não pode cuidar de seus cidadãos.
E a gente só entra na roda, toma no rabo e bate palma, né, gente!?
Se sair ou desistir da roda, aí que toma lá mesmo...
vestibular foi feito pra segregar e não ensinar
vestibular foi feito pra segregar e não pra ensinar
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