terça-feira, 29 de julho de 2008

Doação















Quando a hora já anunciava a passagem de domingo pra segunda-feira armamos nossas redes na varanda pra assistir " Muito além do jardim". Não deveríamos estar na casa ainda, mas as circunstâncias, um pouco de preguiça de voltar e as montadoras de carro brasileiras nos obrigaram a ficar.

Sem mais comida, senão batata frita e biscoito, imaginei viver ali por mais um mês sem comida e sem dinheiro. " Sair por aí tirando frutas das árvores", pensei. Riram de mim. " Só se for coco. Passar um mês se alimentando de coco"!

Muito tempo depois, concentrados no filme, ouvimos um barulho de água sendo derramada ao pé do muro. Um coco simplesmente se abriu, do nada, e choveu água de coco, que foi recebida como uma espécie de milagre da natureza. Uma bênção dos céus, ora! Corremos pra debaixo do coqueiro, de boca aberta, língua pra fora, olhando pra cima feito crianças na chuva. Era doce, mas tinha um sabor meio verde,sabe? De fruta verde.

Depois tudo voltou ao normal, tirando a sensação de que o coqueiro generoso e prestativo deve ter ouvido nossa conversa...

domingo, 1 de junho de 2008

Pátria


Aqui, os pessimistas são servidos a todo instante e os conformistas disputam os restos debaixo da mesa. Queria me proteger da náusea, mas os donos da casa oferecem doces e eu me distraio com a televisão.

Se houvesse mais crianças seria suportável; talvez até alegre. A sisudez de cada cômodo reflete a política padrão: os que fazem e executam as leis precisam externar uma seriedade quase divina, enquanto os criminosos andam desconfiados pelos corredores, rezando para não serem descobertos.

Como o legislador é também criminoso e os criminosos comuns têm sua parcela de poder, todos se tocam superficialmente e guardam ressentimentos que só a diplomacia mais arguta consegue mascarar.

A honestidade é só mais um hormônio em minhas veias. Quando quer se manifestar, é reprimida. "Coisas da juventude", dizem. Pois bem. A alma jovem é serena e ingenuamente sábia. Penso em termos práticos, então: mais dinheiro me compraria um pouco de falsa liberdade, mas ter outro lugar onde viver seria o ideal. Pena não ter pra onde ir...

Eles prometem vantagens e oportunidades de crescimento, mas se a economia vai bem somos os últimos a saber e não há mais um centavo de toda a prosperidade, que foi repartida silenciosamente entre poucos.

Se quer dinheiro, trabalhe! Se quer dinheiro e estabilidade, perca toda a juventude aprendendo várias coisas das quais jamais precisará lembrar e se submeta a concursos, em uma seleção repugnante de robôs programados para um fim específico que ninguém sabe qual é.

É que as funções que eles têm pra jovens nesta casa são obscuramente detestáveis e perversamente inúteis, mas lhe exigem experiência e formação específica em dezenas de coisas que você nunca pensou serem necessárias.

Assim, censurada em minhas vontades, sem tempo pra sonhar e sem dignidade, sou prisioneira entre parentes e amigos, e a casa toda me parece um castelo medieval fedorento e escuro cujas paredes reservam tortura e morte, e o chão inteiro se cobre de mendigos inteligentes, sensíveis e criativos sobre o qual se movem os ricos robôs indiferentes, programados para precariedade, decadência e nada mais.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Sobre um pardal cego e a complicada natureza humana

Meia-Noite!

Como faço todos os dias, levo minha cadela para passear. O nome dela é Brenda (mas Levi, eu juro! Quando eu ganhei ela já tinha esse nome!). É sempre a mesma rotina - por volta de meia noite rodeio dois quarteirões com ela (um trajeto parecido com um "8"), dou uma passada na avenida e fico parado, conto dez carros (?) e volto pela rua que dá acesso à minha casa; neste momento do trajeto é a hora da liberdade, o grande momento do dia da Brenda - eu solto a coleira dela e ela sai farejando freneticamente todos os postes, todas as manchinhas na calçada que podem parecer uma urinada de cão; e por fim ela mesmo dá uma mijada também para tentar passar para outros cães transeuntes a mensagem de que aquele lugar já era território marcado. Trata-se de uma Cocker Spaniel. Dourada. Linda!

Acontece que, quando estou prestes a chegar em meu lar doce lar, me deparo com uma cena inusitada.

Vejo um pássaro voando rasante e se estatelando nas paredes das casas. Ele voa, bate com a cara na parede e volta ao asfalto novamente. Deixo minha cadela dentro de casa e volto. Tenho que conferir este “fenômeno” com mais atenção. Ao voltar, encontro o pássaro no meio do asfalto. Pego-o com a mão (claro que sob inúmeros “pios” de protesto da ave), e vejo que se trata de um pardal. Olho mais perto e percebo também que o rosto dele está gravemente machucado, tem uma fratura muito feia na parte superior ao bico, um grande buraco, profundo. Olho mais perto ainda e, para meu espanto, vejo que na verdade o buraco vai até os olhos, uma fenda aberta, como se fosse causado por uma bicada muito forte de um pássaro maior ou uma pedrada de algum “humano” desumano. Acontece, ilustre leitor, que o ferimento não só abriu uma fenda na cabeça do pobre pássaro, como também estraçalhou seus dois olhos!

Ele não têm olhos! Ele é cego! Ele ficou cego com o duro golpe!

Nossa! Sinto um calafrio subindo minha espinha dorsal, um aperto no coração. Sinto-me um verdadeiro idiota impotente. O que fazer? Um pardal cego! Meu Deus!

Por um segundo, um segundinho de nada, me passa pela cabeça a deprimente idéia de deixá-lo lá. Sabe aquele raciocínio do tipo: “Deixe que a natureza se encarregue de tudo George, vá para casa, faça seu leite com nescau e farinha láctea, veja um pouco de tv, durma e seja feliz.

Resultado?

Trouxe-o para casa! Pego uma caixa espaçosa e coloco delicadamente meu novo “hóspede” nela.
Tento dar água, ele bebe um pouco.
Nossa, que situação ein? Agora estou aqui no quarto com um pássaro cego ao meu lado dentro de uma caixa e não faço idéia do que fazer.
É claro, não preciso ser um veterinário para deduzir que, no andar da carruagem, esse pobre pardal vai ser promovido para voar logo, entre nuvens e anjos tocando harpas, no reino dos céus dos passarinhos.
O que deu em mim? Investir tempo numa causa perdida.

Será que é perdida mesmo? Talvez não totalmente.

Explico.

Olhando agora para ele, lembro-me de uma história que meu professor de filosofia contou para ilustrar o estilo literário da chamada “filosofia oriental”.
Ele disse que, basicamente, a filosofia oriental consistia em histórias (parábolas) com conteúdos que sempre representam uma lição de cunho moral. E diante disso ele contou a seguinte história:

Um mestre estava a caminhar com seu discípulo. Estavam passando à beira da lagoa quando seu discípulo, surpreso, disse:

-Olhe mestre! Um escorpião está se afogando no meio da lagoa!

O mestre não pensou duas vezes! Desfez-se da túnica e, imediatamente, adentrou na lagoa . Nadou até onde o escorpião estava a se afogar, e tentou trazê-lo a margem com a mão. Durante a tentativa, o escorpião desferiu inúmeras picadas na mão do mestre. O mestre, mesmo em meio a gritos de dor, conseguiu, à duras penas, trazer o escorpião à margem e salvá-lo.
O discípulo, não pouco espantado, perguntou ao mestre:

- Como podes mestre? Esforçar-te pra salvar um ser com a natureza tão ruim? Ele lhe desferiu dezenas de picadas enquanto o senhor tentava fazer o bem à ele!

O mestre, mesmo em muitas dores, conseguiu dar um leve sorriso no canto da boca e respondeu:

- Observastes bem meu jovem, de fato o escorpião me picou porque estava seguindo a sua natureza.

No que o discípulo novamente disse:

- Então mestre? Porque o salvou?

- Porque, salvando-o, eu estava seguindo a minha natureza.

Eu salvei esse pobre pardal cego porque estava seguindo minha natureza ilustre leitor. Simplesmente não podia deixá-lo ali, cego e desamparado. Sim ele vai morrer eu sei! Mas morrerá na segurança dos meus cuidados e, provavelmente, terá um enterro decente! E chorarei sua morte fazendo com que ele, para sempre, seja lembrado em minha memória - e claro, neste texto.

Me vêm agora à cabeça uma passagem nas Escrituras Sagradas que diz:

“Vinde, benditos de meu pai, recebei por herança o Reino preparado para vós desde a fundação do mundo. Pois tive fome e me destes de comer. Tive sede e me destes de beber. Era forasteiro e me acolhestes. Estive nu e me vestistes, doente e me visitastes, preso e viestes ver-me. Então os justos lhe responderão: Senhor, quando foi que te vimos com fome e te alimentamos, com sede e te demos de beber? Quando foi que te vimos forasteiro e te recolhemos ou nu e te vestimos? Quando foi que te vimos doente ou preso e fomos te ver? Ao que lhes responderá o rei: Em verdade vos digo: cada vez que o fizeste a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes.”
Evangelho de Mateus, cap. 25, vers.34 - 40. (Versão da bíblia de Jerusalém)

Neste momento meu amiguinho está em sua caixa, andando de um lado a outro tentando entender que lugar é aquele. Sacode suas penas, dá uma ciscada, olha para cima como se pudesse enxergar alguma coisa e lança-se em mais um vôo em direção ao nada (na perspectiva dele), e em direção à parede (na minha perspectiva).

Sinto dizer, mas vou ausentar-me por um instante ilustre leitor, tenho um novo amigo para cuidar.

Já lhe dei até um nome:

Chama-se Bart!

Uma referência e singela homenagem à Bartimeu, o cego de Jericó que estava à beira do caminho e foi curado pelo Mestre!

Tem uma lenda popular onde se diz que, às vezes, Jesus se disfarça de mendigo para testar a bondade dos homens. Será que ele se disfarçaria de pardal cego? Será que o pardal vai morrer? Não, não vou pensar nisso. Todos vamos morrer! A questão não é a morte, mas sim a vida que se vive. E isso já é um outro assunto...

“Entraste na casa do meu corpo,
desarrumaste as salas todas
e já não sei quem sou, onde estou.
O amor sabe. O amor é um pássaro cego
que nunca se perde no seu vôo.”

Casimiro de Brito

Música: Voa Liberdade
Cantor: Jessé



quinta-feira, 8 de maio de 2008

Fortaleza feia e transtornada

Durante quase três dias de greve, foi quase impossível se desemblogar. Sair de casa envolvia certos riscos. Até mesmo para quem estava dentro de seu próprio carro. A cidade parecia mais uma selva de máquinas e de pessoas irritadas.

1. Congestionamento próximo ao terminal de Parangaba. Todo tipo de infração de trânsito e ausência da AMC. Entre 11:00 e 14:00 horas do dia 08/04/08.

2.Transporte improvisado de trabalhadores na Av. Dedé Brasil.

3.Ruas secundárias também engarrafadas. Estes moradores nunca devem ter visto tantos carros ao mesmo tempo.




domingo, 20 de abril de 2008

Legado Um

Agir mais por amor do que por obrigação;
mais por gratidão do que por obediência

domingo, 13 de abril de 2008

Chuva


Chuva é uma coisa interessante.. estava estudando física estatística[crianças não tentem isso em casa, pode ser muito perigoso sem a supervisão de um adulto, afinal de contas vocês podem começar a ingerir grandes quantidades de capucino e suas mentes começam a viajar de uma forma descontrolada hehehehe] quando começou a chover de uma forma na qual até com medo eu fiquei, talvez tenha algo a ver com meu céu estrelado[o teto do meu quarto] começar a mostrar sinais de infiltração ou talvez esse barulho enorme das gotas de água batendo no teto do meu quarto. Onde eu quero chegar, é que no fim das contas algo me impulsionou a ir à janela principal da minha casa, de onde eu tenho uma vista privilegiada da praia e uma pracinha que tem aqui perto, para contemplar essa bendita chuva. Nessa contemplação, e talvez ainda por efeito dos capucinos, minha imaginação começou a fluir. Mas de alguma forma eu não consegui pensar nas desgraças que a chuva trás consigo, como o que está acontecendo no interior e em alguns locais urbanos, nos quais casas estão sendo destruídas, raios estão atingindo pessoas, no mais, pessoas estão sofrendo. Me desculpem mas eu não consegui. De alguma forma eu só consegui pensar, afinal de contas eu estava contemplando, na parte “boa”, na beleza da chuva, nas plantações no mesmo interior que antes foi citado e por um lado pessoal eu comecei a lembrar de acontecimentos muitas vezes deixados na periferia do nosso campo de consciência. Momentos esses que vão ficar pra sempre na minha mente, como quando eu era criança e adorava fazer barquinhos de papel e ver até onde ele ia antes de afundar e ser mais um pedaço de papel molhado, assim também lembrei de um beijo que dei na chuva em um dia em que tudo parecia estar arruinado exatamente por causa dela, a chuva, mas foi ela que no fim das contas salvou o dia, beijem na chuva, é muito bom. Lembrei também das vezes de quando eu ainda era criança e tomava banho, literalmente, de chuva, como uma vez que fiz competição de barrigada na poça de chuva na casa dos meus primos [hehehe], muito bom![crianças isso vocês podem fazer, talvez fiquem de castigo ocasionalmente, como eu fiquei, mas vai valer a pena!]. A chuva também une as pessoas, ou você nunca ficou um tempo a mais com quem você ama por causa dela? Sabe, aquele sofá quentinho assistindo um filme e nem percebendo o tempo passar, assim também com os amigos jogando “peace”, oops, war[apesar de nesse caso, esse jogo ser destruidor de lares e amizades hehehe] então, vou usar outro exemplo como twister, esse é mais interessante, afinal de contas acontecem uns malhos involuntários [hahahaha]. E para os amantes da literatura, a chuva é uma benção, ler um bom livro acompanhado de um bom chocolate quente é uma das coisas mais prazerosas da vida! Na verdade eu poderia passar a noite escrevendo sobre todos os benefícios dessa bendita chuva, mas ainda tenho que terminar de estudar. Então no fim das contas, antes de parar pra pensar na sua chapinha estragada ou ter que acordar numa segunda-feira às 5h30min da manhã pra ir pra faculdade ou trabalhar ou em todas aquelas poças d’água, que os carros teimam em passar por cima em alta velocidade pra te molhar, sorria e pense nos benefícios dessa dádiva que é a chuva, e que de bônus você ainda tem a oportunidade única de ver um dos efeitos mais belos feitos por Deus, o arco-íris! E que chova bem muito..

segunda-feira, 17 de março de 2008

O Mérito de Maquiavel

Diz-se do Brasil que é um país sem memória. Conta-se ainda que a história é contada pelos detentores do poder, permeada das perspectivas ideológicas que os apetecem. Pois bem: a memória do Brasil é curta não apenas na cabeça das pessoas, mas ainda na preservação de arquivos e documentos - o que é decerto mais grave - e, quando sobra alguma coisa para contar, revelam apenas um pedaço microscópico de um universo de possibilidades tão vasto (ou mais) quanto o possível de se imaginar.

Mas pergunto-vos, meus amigos: e se tivéssemos mais lembranças, teríamos boas histórias para contar!? Falo de boas lembranças em níveis para além dos familiares: conquistas coletivas, sociais, políticas. A História, ciência com agá maiúsculo, essa não pode reclamar muito do passado, apenas estudá-lo, relatá-lo, aprofundá-lo. Mas é ela mesma quem nos propõe a tessitura do futuro através do presente!

Se hoje não temos lembranças de ontem, meus amigos, a História nos conclama à feitura da lembrança de amanhã.



Tomemos, pois, a questão do mérito de Maquiavel: a grande "sacada" do filósofo florentino em "O príncipe" foi, segundo boa parte dos seus críticos, a de relatar a política tal qual ela é, e não como deveria ser - "vício" de tantos outros filósofos da política. Teria, pois, afastado toda sorte de idealização e proselitismo para desvelar as entranhas de como a política realmente funcionava.

Ou funciona: estará aí o erro dos politicistas (políticos, analistas, cientistas e jornalistas políticos) de hoje? Maquiavel deixou de ser uma profunda análise da política de seu tempo e lugar para tornar-se uma cartilha pela qual se pautam muitos dessas figuras públicas. Ganhou até adjetivo e advérbio! À sombra do epitáfio de Maquiavel se abrigam covardes e facínoras da História, deixando a política do jeito que ela é; conservadora, estacionária, reacionária.

Não será um absurdo que o livro, dos idos de 1513, permaneça, por ironia dos tempos, como estrela-guia ideológica de políticos a esquerda e à direita!? Ou, se preferirem chamar-me de "jovem e rebelde" (como chamariam a Rômulo Justa sobre Descartes*), não seria muito mais radical e ultrajante contestar um paradigma de meio milênio do que aquele, recém-nascido na cuca fundida de nossos pais? Não serão dessa perspectiva as recentes gerações mais próximas e vitimadas por aquela ideologia que caracteriza o pensamento moderno (mesmo a mais de duzentos anos do fim da Era Moderna)?

Que o mérito de Maquiavel caiba a ele, e só ele, fechado no seu século XVI.

E que nós tenhamos coragem de nos apropriar de nosso tempo e espaço.